Universidade de Aveiro investiga suplemento anti-colesterol a partir de cogumelos
O Departamento de Química da Universidade de Aveiro e a Cuga estão a transformar subprodutos dos cogumelos num suplemento alimentar que diminui o risco de doenças cardiovasculares.
A investigação propõe recuperar compostos que hoje são descartados e dar-lhes uma nova vida.
“O suplemento evitará níveis elevados de colesterol no sangue, será acessível e economicamente viável”, afirma Filipe Gomes, responsável pela investigação.
O Departamento de Química da Universidade de Aveiro (UA), em colaboração com a Cuga – a maior empresa produtora de cogumelos em Portugal – está a desenvolver um suplemento alimentar que reduz os níveis de colesterol no sangue.
A investigação tem como base a recuperação de subprodutos dos cogumelos produzidos e embalados nas unidades da Cuga, para os quais a unidade de investigação Laboratório Associado para a Química Verde da Rede de Química e Tecnologia (LAQV-REQUIMTE) da universidade aveirense está a estudar a transformação num produto natural com benefícios para a saúde cardiovascular.
“Esta colaboração nasceu da perceção da quantidade de subprodutos dos cogumelos produzidos e da sua riqueza em compostos, nomeadamente as beta-glucanas”, explica Filipe Gomes, investigador do Departamento de Química da Universidade de Aveiro e responsável pela investigação.
“Depois de extrairmos estes compostos bioativos, estudamos a forma como eles interagem com os ácidos biliares presentes no intestino”.
Segundo o investigador, as beta-glucanas dos cogumelos sequestram os ácidos biliares que são responsáveis pela emulsificação do colesterol, impedindo a sua absorção para a corrente sanguínea, enquanto o colesterol não emulsificado acaba por ser excretado pelas fezes.
Para a Cuga, este estudo destaca o cogumelo como alimento saudável e cria um produto de mercado muito benéfico para a saúde com origem nas suas unidades. Ao mesmo tempo, atribui utilização económica a cerca de 10% dos cogumelos frescos produzidos que hoje são um subproduto não aproveitados.
“São pés, fragmentos de cogumelos e unidades fora do calibre que totalizam, aproximadamente, 500 toneladas de subproduto desperdiçado por ano”, afirma Nuno Pereira, CEO da Cuga.
“Este trabalho conjunto com a Universidade de Aveiro vai transformar este desperdício num suplemento alimentar natural com boas perspetivas de mercado”.
A Cuga, detentora de 80% de quota no mercado português de cogumelos, tem unidades em Vila Flor, em Vila Real e em Paredes.
Produz anualmente cerca de cinco mil toneladas de cogumelos que embala e são vendidos, na sua maioria, em grandes superfícies.
Cerca de um terço das mortes em Portugal são causadas por doenças cardiovasculares, sendo o colesterol elevado um dos principais fatores de risco.
“Estas patologias desenvolvem-se ao longo dos anos de forma silenciosa e, além da alta taxa de mortalidade, podem causar consideráveis graus de dependência nos sobreviventes”, afirma Filipe Gomes.
O suplemento que está a ser desenvolvido pela UA tem propriedades hipocolesterolémicas – com potencial para evitar os níveis elevados de colesterol no sangue – e é, em simultâneo, “acessível e economicamente viável”, afirma o responsável pela investigação.
A elevada percentagem de desperdício alimentar na Europa também tem preocupado os investigadores da Universidade de Aveiro.
“As grandes cadeias de supermercados regem-se por regulamentos que privilegiam alimentos frescos com formato, cor e calibre padronizado”, refere Filipe Gomes.
“O problema é que estas normas resultam no desperdício de cerca de 30% da produção agrícola global”.
Com esta investigação, e alinhado com os objetivos da unidade de investigação LAQV-REQUIMTE e da Cuga, o Departamento de Química da UA e a empresa produtora de cogumelos procuram aumentar a sustentabilidade ambiental da indústria e contribuir para um modelo e uma economia circular mais eficiente.
“Beneficiar os consumidores e o ambiente”
O trabalho realizado nos laboratórios da Universidade de Aveiro inclui a extração e a caracterização química dos compostos presentes nos cogumelos, assim como a sua avaliação no efeito hipocolesterolémico.
Com este estudo a equipa de investigação do Departamento de Química da UA tem conseguido “perceber os mecanismos de ação dos compostos presentes nos subprodutos dos cogumelos” e, também, “conceber regras que ajudam a elaborar o design funcional do suplemento alimentar”.
Os testes realizados até agora revelam que “estes mecanismos de ação são semelhantes aos de ingredientes já reconhecidos pela Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA)”, afirma o responsável pelo projeto.
Para Nuno Pereira, este trabalho é um dos motores da estratégia de inovação e sustentabilidade que a empresa iniciou ao lançar, em outubro de 2024, a nova marca Cuga. “Estando agora a Cuga a consolidar-se como a referência nacional para a produção de cogumelos, nós sabemos que o futuro passa por encontrar novas formas de valorizar cada fase da nossa cadeia produtiva”, afirma o CEO.
“Esta parceria com a Universidade de Aveiro permite-nos isso mesmo: explorar soluções inovadoras que beneficiam tanto os consumidores como o ambiente”.
Filipe Gomes destaca a relevância desta investigação para o setor agroalimentar, referindo que “os cogumelos são uma fonte extremamente rica em compostos bioativos” com aplicações que vão muito além da alimentação.
“Com este projeto conseguimos aproveitar subprodutos que antes eram desperdiçados e transformá-los num suplemento alimentar que regula o colesterol e minimiza as doenças cardiovasculares e os seus efeitos nefastos”, explica o investigador.
“Espero que seja possível, num futuro próximo, facilitar o acesso a este suplemento a todas as pessoas”, conclui.
Texto: UA